USO DE MARCADORES BIOLÓGICOS NOS REGISTROS POR ELETROENCEFALOGRAMA (EEG) PARA RESPOSTAS A ESTÍMULOS MUSICAIS: IMPLICAÇÕES PARA A SAÚDE MENTAL E NEUROPLASTICIDADE
Use of Biological Markers in Electroencephalogram (EEG) Records for Responses to Musical Stimuli: Implications for Mental Health and Neuroplasticity
Zaika Capita
Endereço correspondente: dracapitta@gmail.com
Publicação: 17/10/2024
DOI: 10.55703/27644006040207
RESUMO
Este artigo teve como objetivo revisar, de forma integrativa, o impacto dos estímulos musicais monitorados por eletroencefalograma (EEG) sobre a neuroplasticidade e a saúde mental. Foram analisados 20 estudos que utilizaram diferentes gêneros musicais e avaliaram seus efeitos sobre os padrões de ondas cerebrais, bem como sobre aspectos emocionais e cognitivos de pacientes saudáveis e clínicos. A música clássica mostrou-se capaz de induzir predominantemente ondas alfa (8-12 Hz), associadas ao relaxamento e à redução da ansiedade, enquanto a música mais rítmica, como a eletrônica, induziu ondas beta (13-30 Hz), correlacionadas à atenção e ao processamento cognitivo. Pacientes com transtornos do espectro autista (TEA) e doenças neurodegenerativas, como Parkinson, apresentaram melhora na conectividade cerebral e na cognição social após a exposição à música interativa e rítmica. A revisão demonstrou que a música pode ser uma intervenção terapêutica eficaz, promovendo o bem-estar emocional, modulação cognitiva e reorganização das redes neurais. Conclui-se que a música possui potencial terapêutico valioso para a saúde mental e reabilitação neurológica, embora sejam necessários mais estudos para padronizar as intervenções musicais e suas aplicações clínicas.
Palavras-chave: Música; Eletroencefalograma; Neuroplasticidade; Saúde mental; Intervenção terapêutica.
ABSTRACT
This article aimed to integratively review the impact of music stimuli monitored by electroencephalogram (EEG) on neuroplasticity and mental health. A total of 20 studies were analyzed, which utilized different musical genres and assessed their effects on brainwave patterns, as well as on the emotional and cognitive aspects of healthy and clinical patients. Classical music predominantly induced alpha waves (8-12 Hz), associated with relaxation and anxiety reduction, while more rhythmic music, such as electronic music, induced beta waves (13-30 Hz), correlated with attention and cognitive processing. Patients with autism spectrum disorder (ASD) and neurodegenerative diseases, such as Parkinson’s, showed improvements in brain connectivity and social cognition after exposure to interactive and rhythmic music. The review demonstrated that music can be an effective therapeutic intervention, promoting emotional well-being, cognitive modulation, and reorganization of neural networks. It is concluded that music has valuable therapeutic potential for mental health and neurological rehabilitation, although further studies are needed to standardize musical interventions and their clinical applications.
Keywords: Music; Electroencephalogram; Neuroplasticity; Mental health; Therapeutic intervention.
INTRODUÇÃO
A música, uma forma universal de expressão humana, desempenha um papel importante na regulação emocional e na cognição. Estudos ao longo das últimas décadas têm demonstrado que a música não apenas influencia o humor e o bem-estar psicológico, mas também pode modular funções cerebrais complexas, como a memória, a atenção e a neuroplasticidade【1,2】. Através da eletroencefalografia (EEG), pesquisadores têm sido capazes de explorar como o cérebro responde a diferentes estímulos musicais, revelando uma correlação direta entre a música e os padrões de atividade elétrica cerebral, o que tem importantes implicações clínicas e terapêuticas【3】.
A utilização de EEG para monitorar a atividade cerebral em resposta a estímulos musicais permite a identificação de padrões específicos de ondas cerebrais, como as ondas alfa e beta, associadas a estados de relaxamento e atenção, respectivamente【4】. Essas descobertas têm implicações significativas no tratamento de transtornos neuropsiquiátricos, como depressão, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), onde a música tem sido aplicada como uma terapia complementar eficaz【5】. Além disso, a música pode induzir estados alterados de consciência, o que é de interesse particular na musicoterapia, onde é utilizada para acessar conteúdos inconscientes e facilitar a cura emocional【1】.
Recentemente, a música também foi associada à melhoria da cognição social, particularmente em indivíduos com perturbações do desenvolvimento neurológico, como o autismo. Através da prática musical interativa, a cognição social, incluindo a capacidade de perceber e responder adequadamente às emoções de outras pessoas, pode ser significativamente aprimorada【2,6】. Isso destaca o potencial da música não apenas como uma ferramenta recreativa, mas como uma intervenção terapêutica robusta para a modulação do comportamento e da função cerebral【6,7】.
O EEG também tem sido amplamente utilizado em estudos sobre a neuroplasticidade, particularmente em condições como a doença de Parkinson. Pacientes com Parkinson, por exemplo, apresentam alterações na conectividade cerebral que podem ser monitoradas e moduladas por meio de estimulação musical【8,9】. A música tem demonstrado a capacidade de restaurar parte dessa conectividade funcional, promovendo melhorias na mobilidade e na qualidade de vida dos pacientes【9】. Estudos sugerem que a música pode aumentar a atividade nas áreas cerebrais responsáveis pelo controle motor, e que esse efeito é potencialmente mediado pelas ondas cerebrais detectadas pelo EEG【9,10】.
Além dos impactos neurológicos, a música também tem um efeito comprovado sobre os parâmetros fisiológicos, como a pressão arterial, a frequência cardíaca e a respiração【11】. Em ambientes clínicos, como o pré-operatório odontológico, a música tem sido usada para reduzir os níveis de ansiedade dos pacientes, estabilizando esses parâmetros vitais durante procedimentos invasivos【12】. Tais intervenções musicais, caracterizadas por serem de baixo custo e altamente aceitáveis pelos pacientes, oferecem uma alternativa viável para o controle do estresse e da ansiedade sem a necessidade de farmacoterapias adicionais【12,13】.
A pesquisa sobre os efeitos da música no cérebro através do EEG está proporcionando avanços significativos na compreensão dos mecanismos que regem a neuroplasticidade e a saúde mental【14,15】. A música, ao induzir padrões cerebrais específicos, tem o potencial de promover a plasticidade sináptica, crucial para o aprendizado, a memória e a recuperação de lesões cerebrais【16】. Ondas cerebrais como as ondas alfa, associadas a estados de relaxamento, têm sido consistentemente observadas em indivíduos expostos à música, sugerindo que a música pode facilitar um estado mental propício à recuperação e ao bem-estar【17】.
Diante desses avanços, este estudo visa explorar de forma aprofundada o uso de marcadores biológicos nos registros de EEG em resposta a estímulos musicais, analisando suas implicações para a saúde mental e a neuroplasticidade. Ao focar nos mecanismos neurológicos subjacentes à exposição musical, espera-se fornecer uma compreensão mais clara de como a música pode ser usada como uma ferramenta terapêutica eficaz para modular a atividade cerebral e promover o bem-estar psicológico.
METODOLOGIA
Este estudo adotou um delineamento exploratório de revisão integrativa da literatura, com o objetivo de analisar o uso de marcadores biológicos em registros de eletroencefalograma (EEG) em resposta a estímulos musicais, e suas implicações para a saúde mental e neuroplasticidade. A revisão seguiu uma abordagem estruturada em várias etapas, abrangendo a definição da questão de pesquisa, seleção criteriosa das bases de dados, coleta de estudos relevantes, análise dos dados extraídos e síntese das evidências.
- Questão de Pesquisa
A questão que guiou este estudo foi: Como os estímulos musicais influenciam os registros de EEG, e quais são as implicações para a neuroplasticidade e saúde mental? Esta questão foi formulada para permitir uma análise detalhada dos estudos existentes sobre a influência da música na atividade cerebral e nos marcadores biológicos relacionados à saúde mental.
- Critérios de Inclusão e Exclusão
Os critérios de inclusão para os estudos selecionados foram:
- Estudos publicados entre 2014 e 2023.
- Pesquisas que utilizassem EEG para avaliar a resposta do cérebro a estímulos musicais.
- Artigos que investigassem os efeitos da música na saúde mental, cognição ou neuroplasticidade.
- Publicações em português, inglês ou espanhol.
Os critérios de exclusão envolveram:
- Estudos sem o uso de EEG como método de avaliação.
- Artigos de opinião, revisões sem metodologia estruturada ou resumos de congressos.
- Estudos com foco em música como entretenimento, sem enfoque na saúde mental ou neurociência.
- Fontes de Dados e Estratégia de Busca
A busca pelos artigos foi realizada nas seguintes bases de dados: PubMed, Scopus, ScienceDirect, e SciELO. Os descritores utilizados incluíram termos como “eletroencefalograma”, “EEG”, “música”, “neuroplasticidade”, “saúde mental”, “marcadores biológicos” e “terapia musical”, combinados através de operadores booleanos (AND, OR). A busca foi ajustada para cada base de dados, levando em consideração as peculiaridades de indexação de cada plataforma.
- Processo de Seleção de Estudos
A seleção dos estudos foi conduzida em duas etapas. Inicialmente, os títulos e resumos dos artigos foram avaliados com base nos critérios de inclusão e exclusão. Os estudos que passaram por essa triagem inicial foram submetidos a uma leitura completa para verificar a relevância e adequação ao objetivo da pesquisa. Após essa etapa, um total de 20 estudos foi incluído na análise final, todos os quais exploram a relação entre música, EEG, neuroplasticidade e saúde mental.
- Extração e Análise dos Dados
Os dados foram extraídos dos estudos selecionados utilizando um formulário padronizado. As seguintes informações foram registradas: autores, ano de publicação, tipo de estudo, população avaliada, metodologia utilizada (especificamente o tipo de EEG), resultados principais relacionados aos estímulos musicais e à neuroplasticidade, e conclusões sobre a saúde mental.
A análise dos dados foi realizada através de uma abordagem qualitativa, onde os resultados dos estudos foram agrupados por similaridade de abordagens e desfechos. A ênfase foi dada aos padrões de EEG observados durante a exposição a estímulos musicais, bem como aos marcadores biológicos associados a mudanças na neuroplasticidade e nos estados emocionais.
- Síntese dos Resultados
Os dados extraídos foram sintetizados para identificar padrões comuns entre os estudos e verificar a robustez das evidências. Estudos que investigaram os efeitos da música em pacientes com distúrbios neuropsiquiátricos, como depressão e ansiedade, receberam especial atenção, assim como aqueles que exploraram a relação entre a música e a melhora da cognição em indivíduos saudáveis. A síntese incluiu uma discussão crítica sobre a aplicabilidade clínica desses achados.
- Limitações do Estudo
Apesar dos esforços para realizar uma revisão abrangente, algumas limitações devem ser mencionadas. Em primeiro lugar, a heterogeneidade dos estudos incluídos, especialmente em relação aos métodos de coleta de EEG e aos tipos de estímulos musicais utilizados, pode ter influenciado a comparabilidade dos resultados. Além disso, a ausência de estudos longitudinais limita a compreensão do impacto da música na neuroplasticidade a longo prazo. Outro fator é a predominância de estudos realizados em contextos clínicos específicos, o que pode restringir a generalização dos achados.
RESULTADOS
A análise dos 20 artigos selecionados para este estudo revelou uma ampla gama de achados sobre o impacto dos estímulos musicais na atividade cerebral, saúde mental e neuroplasticidade, com base nos registros de eletroencefalograma (EEG). A seguir, os resultados são apresentados de forma detalhada em três categorias principais: (1) padrões de ondas cerebrais induzidos por estímulos musicais, (2) efeitos terapêuticos da música sobre a saúde mental, e (3) alterações relacionadas à neuroplasticidade.
- Padrões de Ondas Cerebrais Induzidos por Estímulos Musicais
Os estudos demonstraram que a exposição a diferentes gêneros musicais produz padrões distintos de ondas cerebrais capturados pelos registros de EEG. A música clássica e instrumental foi amplamente associada ao aumento de ondas alfa (8-12 Hz), as quais estão correlacionadas a estados de relaxamento e diminuição do estresse【1,2】. Um estudo realizado por Dias et al. revelou que pacientes expostos à música clássica apresentaram uma elevação significativa da atividade alfa, sugerindo uma indução de relaxamento cerebral profundo durante a exposição musical【1】. Esse mesmo padrão foi observado em indivíduos saudáveis avaliados por Menezes et al., que demonstraram um aumento das ondas alfa durante a exposição à música instrumental, indicando redução do estresse e ansiedade【6】.
Por outro lado, gêneros mais rítmicos, como pop e música eletrônica, resultaram predominantemente no aumento das ondas beta (13-30 Hz), associadas à atenção e ao processamento cognitivo【7】. Em um estudo com estudantes universitários, Francisco et al. observaram que a música eletrônica induziu um aumento das ondas beta, sugerindo um estado de alerta e maior engajamento mental【7】. Essa diferença de resposta cerebral entre tipos de música demonstra a diversidade dos efeitos neurológicos induzidos por diferentes estilos musicais.
A música interativa (improvisação) foi particularmente eficaz em indivíduos com transtornos do espectro autista (TEA). Borges et al. relataram que a exposição à música interativa promoveu um aumento tanto nas ondas alfa quanto nas ondas beta, sugerindo que a música pode induzir uma reorganização funcional das áreas cerebrais associadas à cognição social【2】. A melhora na conectividade cerebral em pacientes com TEA também foi observada, reforçando o potencial terapêutico da música em condições neurológicas específicas.
Figura 1: Padrões de ondas cerebrais induzidos por diferentes gêneros musicais.
A Figura 1 resume os padrões de ondas cerebrais (alfa, beta e gama) induzidos por diferentes gêneros musicais. Observa-se que a música clássica e instrumental tem um efeito marcante na indução de ondas alfa, associadas ao relaxamento, enquanto gêneros mais rítmicos, como música eletrônica e pop, aumentam predominantemente as ondas beta, relacionadas ao estado de alerta e processamento cognitivo. A música interativa parece equilibrar ambos os padrões, especialmente em indivíduos com condições neurológicas específicas, como o TEA.
A diversidade nos padrões de ondas cerebrais demonstra que diferentes tipos de música podem ser aplicados de maneira personalizada para promover estados mentais distintos, como relaxamento, concentração ou cognição social【7】.
- Efeitos Terapêuticos da Música na Saúde Mental
Os estudos revisados mostraram evidências robustas do impacto terapêutico da música na saúde mental, especialmente em pacientes com transtornos de ansiedade e depressão【5】. Em um estudo conduzido por Santos et al., a exposição à música clássica resultou em uma redução significativa de 30% nos sintomas de ansiedade em pacientes submetidos a sessões de musicoterapia associada ao EEG【5】. Esse efeito ansiolítico da música foi ainda observado em estudos que avaliaram o impacto da música em pacientes antes de procedimentos cirúrgicos. Brandão et al. relataram que a música, quando escolhida pelos próprios pacientes, reduziu consideravelmente os níveis de ansiedade pré-operatória, além de estabilizar os parâmetros vitais como pressão arterial e frequência cardíaca【16】.
A música também teve um impacto positivo sobre pacientes com depressão leve a moderada. Santos et al. observaram que a terapia musical resultou em uma redução de 25% nos sintomas de depressão em pacientes clínicos, especialmente em resposta à música clássica, que promoveu uma diminuição significativa da atividade cerebral associada ao estresse【5】.
Além disso, o impacto da música interativa em indivíduos com TEA foi notável. O estudo de Borges et al. indicou uma melhora de 20% na cognição social dos pacientes, com uma redução dos comportamentos repetitivos e um aumento da conectividade cerebral【2】. Esses resultados sugerem que a música interativa pode ser uma intervenção eficaz para melhorar a função social e cognitiva em indivíduos com condições neuropsiquiátricas.
- Alterações na Neuroplasticidade Induzidas pela Música
Os estudos também forneceram evidências de que a música pode influenciar diretamente a neuroplasticidade, particularmente em pacientes com doenças neurológicas como a doença de Parkinson. Rodrigues et al. investigaram o impacto da música rítmica em pacientes com Parkinson e observaram um aumento na conectividade entre o lobo frontal e parietal, sugerindo uma reorganização funcional das redes neurais envolvidas no controle motor【9】. Esse aumento na conectividade foi associado a uma melhora de aproximadamente 10% na função motora dos pacientes, o que reforça o papel da música na modulação da neuroplasticidade em doenças neurodegenerativas【9】.
Outro estudo conduzido por Dias et al. revelou que a música clássica promoveu um aumento na plasticidade sináptica em indivíduos com transtornos de ansiedade, com base nos registros de EEG que mostraram maior relaxamento e reorganização cerebral【1】. Isso sugere que a música pode ter um papel crucial na facilitação da plasticidade sináptica e na promoção da recuperação neural.
Pacientes saudáveis também mostraram benefícios da exposição à música, com estudos relatando um aumento da atividade nas áreas do cérebro associadas à aprendizagem e memória. Francisco et al. relataram que a música eletrônica aumentou a atividade das ondas gama (>30 Hz) associadas a estados de alta concentração mental e memória【7】. Esses achados reforçam a hipótese de que a música pode não apenas melhorar a cognição em indivíduos saudáveis, mas também promover a neuroplasticidade em condições clínicas.
Figura 2: Melhora da conectividade cerebral em pacientes com TEA e Parkinson após sessões de exposição à música.
A Figura 2 ilustra a melhora da conectividade cerebral em pacientes com transtorno do espectro autista (TEA) e Parkinson ao longo de várias sessões de exposição à música. Pacientes com TEA mostraram uma resposta mais rápida, com uma melhoria significativa na conectividade cerebral a partir da segunda sessão, enquanto os pacientes com Parkinson apresentaram uma progressão mais lenta, mas consistente, ao longo das sessões.
Esses resultados reforçam a importância da música como ferramenta terapêutica tanto para pacientes com distúrbios de desenvolvimento neurológico quanto para aqueles com doenças neurodegenerativas【9】.
DISCUSSÃO
Os resultados desta revisão integrativa confirmam o impacto significativo da música na modulação da atividade cerebral, promovendo efeitos positivos na saúde mental e estimulando a neuroplasticidade. A música, conforme evidenciado pelos registros de eletroencefalograma (EEG), mostrou-se capaz de alterar padrões de ondas cerebrais, promover estados de relaxamento e concentração, além de induzir mudanças nas redes neurais de pacientes com condições neurológicas e psiquiátricas. Esses achados estão alinhados com pesquisas anteriores que sugerem que a música pode ser uma poderosa ferramenta terapêutica em várias populações clínicas e saudáveis【1,2】.
- Alterações nos Padrões de EEG Induzidos por Música
A predominância das ondas alfa observada em resposta à música clássica e instrumental, conforme relatado em estudos anteriores【1,6】, reforça a hipótese de que esse tipo de música pode reduzir a atividade mental associada ao estresse e promover estados de relaxamento. A relação entre a música clássica e a atividade alfa também foi observada em pacientes com ansiedade, onde uma redução significativa nos sintomas foi acompanhada por uma elevação das ondas alfa【1】. Estes achados sugerem que a música pode ter aplicações terapêuticas em intervenções para reduzir o estresse e melhorar o bem-estar emocional, particularmente em ambientes de alta pressão, como o pré-operatório【16】.
Por outro lado, a música mais rítmica, como pop e eletrônica, foi associada ao aumento de ondas beta, implicando em maior atividade cognitiva e atenção【7】. Esse achado é relevante para áreas como a reabilitação cognitiva, onde o aumento da atenção e do processamento cognitivo pode ser benéfico para a recuperação de pacientes com déficit cognitivo ou transtornos neurológicos. Estudos futuros podem investigar como esses diferentes tipos de música podem ser utilizados de maneira personalizada, de acordo com as necessidades de cada paciente.
- Impacto da Música na Saúde Mental
A música demonstrou um claro efeito terapêutico sobre a saúde mental, principalmente em pacientes com transtornos de ansiedade e depressão. A redução de 30% nos sintomas de ansiedade relatada em pacientes expostos à música clássica【5】está em conformidade com estudos prévios que sugerem que a música pode modular o sistema nervoso autônomo, promovendo relaxamento e reduzindo os níveis de cortisol, o hormônio do estresse. A estabilização dos parâmetros vitais, como a pressão arterial e a frequência cardíaca, observada em pacientes odontológicos antes de cirurgias【16】, reforça a ideia de que a música pode ser uma alternativa não farmacológica eficaz para reduzir a ansiedade em ambientes clínicos.
A melhora da cognição social em indivíduos com transtornos do espectro autista (TEA) também é notável. A exposição à música interativa foi associada à melhoria nas habilidades de interação social e redução dos comportamentos repetitivos【2】. Esse achado destaca o potencial da musicoterapia como uma intervenção para melhorar a qualidade de vida de indivíduos com TEA, promovendo uma reorganização funcional nas áreas cerebrais responsáveis pela cognição social.
- Neuroplasticidade Induzida pela Música
Um dos achados mais promissores desta revisão foi a capacidade da música de promover a neuroplasticidade. A melhora da conectividade entre o lobo frontal e parietal, observada em pacientes com doença de Parkinson【9】, sugere que a música pode desempenhar um papel na reorganização das redes neurais e na recuperação motora. Esses achados estão alinhados com a literatura que sugere que a música pode ser utilizada para induzir a plasticidade sináptica e ajudar na recuperação de funções em pacientes com doenças neurodegenerativas【9】.
Além disso, a música foi associada a um aumento da plasticidade sináptica em indivíduos saudáveis, conforme demonstrado pela elevação das ondas gama durante a exposição à música eletrônica【7】. Esse aumento de ondas gama, frequentemente relacionado a estados de alta concentração e memória, sugere que a música também pode ser utilizada para melhorar a cognição e o desempenho mental em indivíduos saudáveis. Estudos adicionais são necessários para investigar o impacto a longo prazo da música na neuroplasticidade e como esses achados podem ser aplicados no contexto clínico, particularmente em populações que sofrem de transtornos cognitivos e neurológicos.
- Limitações do Estudo
Embora os resultados desta revisão integrem evidências significativas sobre o impacto da música na atividade cerebral e saúde mental, algumas limitações devem ser mencionadas. Primeiramente, a heterogeneidade dos estudos, especialmente no que diz respeito aos diferentes gêneros musicais utilizados e aos métodos de coleta de EEG, pode ter influenciado os achados. Estudos futuros devem padronizar as condições experimentais para permitir uma melhor comparação entre os resultados. Além disso, a maioria dos estudos avaliou os efeitos de curto prazo da exposição à música, sendo necessário investigar o impacto a longo prazo, particularmente na indução da neuroplasticidade.
Outra limitação diz respeito ao número relativamente pequeno de estudos que abordaram diretamente os efeitos da música em populações clínicas, como pacientes com depressão severa ou condições neurodegenerativas avançadas. Embora os resultados para a doença de Parkinson sejam promissores【9】, mais pesquisas são necessárias para validar o uso da música como uma intervenção terapêutica robusta em populações mais amplas e diversificadas.
- Implicações Clínicas e Futuras Perspectivas
Os achados desta revisão têm implicações clínicas significativas, particularmente para o uso da música como uma intervenção complementar em tratamentos para ansiedade, depressão, distúrbios do espectro autista e doenças neurodegenerativas. A capacidade da música de promover estados de relaxamento, modular a cognição e melhorar a neuroplasticidade sugere que ela pode ser uma ferramenta valiosa em contextos terapêuticos e reabilitativos.
Futuros estudos devem explorar como diferentes tipos de música, bem como diferentes durações de exposição, podem ser usados para maximizar os benefícios terapêuticos. A personalização das intervenções musicais, levando em consideração as preferências dos pacientes e suas respostas fisiológicas, pode ser uma área promissora para a implementação clínica. Além disso, o desenvolvimento de protocolos de EEG mais padronizados permitirá uma compreensão mais profunda dos mecanismos neurológicos subjacentes à resposta à música.
CONCLUSÃO
O estudo realizado na revisão integrativa sobre o impacto dos estímulos musicais monitorados por eletroencefalograma (EEG) revelou importantes achados que destacam a música como uma intervenção terapêutica potencialmente eficaz. A música demonstrou ser capaz de modular a atividade cerebral, promovendo mudanças significativas nos padrões de ondas cerebrais, com a predominância de ondas alfa associadas ao relaxamento e ondas beta ligadas à atenção e ao processamento cognitivo. Esses achados reforçam a relevância da música em contextos terapêuticos, especialmente em intervenções para reduzir o estresse e melhorar a concentração.
Os efeitos da música na saúde mental foram amplamente evidenciados, particularmente na redução de sintomas de ansiedade e depressão. A música clássica, em especial, demonstrou um impacto significativo, estabilizando parâmetros vitais e promovendo uma diminuição dos níveis de estresse em pacientes antes de procedimentos cirúrgicos. Além disso, a música interativa foi associada a melhorias na cognição social e na qualidade de vida de indivíduos com transtornos do espectro autista.
A capacidade da música de induzir neuroplasticidade foi outro aspecto fundamental identificado. A exposição à música rítmica e interativa promoveu a reorganização das redes neurais em pacientes com doenças neurodegenerativas, como a doença de Parkinson, sugerindo que a música pode desempenhar um papel valioso na reabilitação neurológica. Esses achados abrem novas possibilidades para o uso da música como uma ferramenta complementar para melhorar a função motora e cognitiva em indivíduos com condições clínicas.
Entretanto, este estudo também destacou a necessidade de mais pesquisas para padronizar intervenções musicais e garantir a aplicação consistente dos métodos de EEG. A heterogeneidade dos estudos revisados, em termos de gêneros musicais e condições experimentais, sugere que mais estudos longitudinais e controlados são necessários para avaliar os efeitos de longo prazo da música na neuroplasticidade e saúde mental. Além disso, pesquisas futuras devem investigar como diferentes estilos musicais podem ser adaptados para beneficiar de forma personalizada pacientes com necessidades específicas.
Em resumo, a música, quando aplicada de forma terapêutica, oferece uma intervenção não invasiva, de baixo custo e altamente aceitável, que pode ser utilizada em uma variedade de contextos clínicos. Seu potencial para promover o bem-estar emocional, melhorar a cognição e estimular a neuroplasticidade torna a música uma intervenção valiosa, com aplicações em tratamentos para saúde mental e reabilitação neurológica.
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